Na ressaca de Spectre vou fazer aqui nas próximas semanas uma retrospectiva de uma série que na última década se tem vindo a tornar de forma segura num forte rival de James Bond: Missão Impossível, num primeiro capítulo realizado, de forma algo inesperada, por Brian De Palma.
Missão Impossível (Mission: Impossible), 1996, dir. Brian De Palma
É muito difícil avaliar Missão Impossível sem o contexto actual. Ninguém adivinharia que nove anos depois do filme de Brian De Palma esta saga teria cinco sólidos filmes no seu currículo. Tal como Brian De Palma não era uma escolha óbvia para realizar o primeiro capítulo.
Um dos nomes a emergir do Novo Cinema Americano dos anos 70 De Palma celebrizou-se com alguns filmes de terror e thrillers fortemente inspirados em Alfred Hitchcock. Dos primeiros Carrie é o maior exemplo, sendo que Vestida Para Matar, Blow Out - Explosão ou Testemunha de Um Crime são exemplos clássicos dos segundos. Apesar do sucesso com os filmes de gangsters Scarface - A Força do Poder ou Os Intocáveis, as suas sensibilidades nunca foram de produtos para o grande público. A verdade é que Missão Impossível foi um sucesso de bilheteira e forneceu a Tom Cruise um veículo que tem sido por ele gerido com mestria.
Voltando ao filme onde tudo começou: estava a dizer que será muito difícil avaliar Missão Impossível sem o contexto existente actualmente, especialmente para quem, como eu, nunca tinha visto o filme até agora. É verdade! Sem o fazer activamente consegui até agora evitar ver este filme. Conhecia certas cenas e sequências mas nunca o tinha visto na totalidade. E o que Brian De Palma consegue é um thriller de espionagem que, pegando na natureza episódica da série original, a desfaz, baralhando as cartas e mudando as regras do jogo para a versão cinematográfica. O que era um trabalho de equipa passa a ser a missão de um homem só - Ethan Hunt - à volta do qual podem gravitar incontáveis variações de elementos em aventuras seguintes.
Mas Missão Impossível não é só o filme de origem da saga. Apesar das componentes tecnológicas extremamente datadas em 2015, tal como algum do CGI utilizado, as cenas de acção são emocionantes e, tirando alguns pormenores como a elipse (ou omissão total) na lógica dos disfarces de bombeiros na sequência de Langley, a narrativa é surpreendentemente coerente e De Palma diverte-se com as revelações que vão sendo feitas jogando com a percepção do espectador em relação aquilo que sabe ou pensa saber a mais que as próprias personagens. Não espantará encontrar nos créditos do argumento nomes de peso como David Koepp, Steven Zaillian e o veterano Robert Towne.
A banda sonora de Danny Elfman actualiza o famosíssimo tema da série de TV na mesma medida que o conceito desta é reinventado para o grande ecrã, alienando talvez alguns fãs mais ferrenhos, mas abrindo as portas a um franchise moderno e dinâmico. Ethan Hunt torna-se assim em sinónimo de Missão Impossível para uma nova geração.
Uma agradável surpresa e um óptimo primeiro capítulo para um novo herói para o século XXI.